Apesar de um movimento de recuperação desde 2022, o Brasil segue enfrentando sérios desafios na imunização infantil. O Anuário VacinaBR, elaborado pelo Instituto Questão de Ciência (IQC), em parceria com a Sociedade Brasileira de Imunizações (Sbim) e o Unicef, mostra que, em 2023, nenhuma das vacinas do calendário infantil atingiu a meta de cobertura de 95% em todos os estados.
Entre os imunizantes com pior desempenho estão os contra poliomielite, meningococo C, varicela e Haemophilus influenzae tipo B. A meta, que garante a proteção coletiva e impede a circulação de vírus e bactérias, não foi atingida em nenhum estado brasileiro. A situação é ainda mais grave ao se observar os municípios: menos de 32% das cidades cumpriram a meta para vacinas consideradas prioritárias, como a pentavalente e a tríplice viral.
O Ceará foi o estado com melhor desempenho, com 59% das cidades alcançando as metas. No outro extremo, o Acre registrou apenas 5% de municípios com cobertura ideal.
Segundo Paulo Almeida, diretor executivo do IQC, os dados revelam uma grande disparidade entre regiões e até mesmo entre cidades vizinhas. Ele destaca que, diante das dimensões do Brasil, é preciso adaptar estratégias às realidades locais. “Não dá para tratar a imunização como algo uniforme”, afirma.
A vacinação contra a tuberculose (BCG), que costuma ser feita logo após o nascimento, atingiu a meta em apenas oito unidades da federação. No Espírito Santo, pouco mais da metade dos bebês foi imunizada. Mesmo dentro dos estados, há municípios com 100% de cobertura e outros com índices abaixo de 50%.
A diretora da Sbim, Isabela Ballalai, ressalta que o problema vai além da oferta de vacinas. “Temos 38 mil salas de vacinação, mas se o atendimento é ruim, em horário restrito ou sem vacinas disponíveis, as pessoas não voltam”, explica. A especialista aponta ainda a baixa percepção de risco como uma das principais causas da hesitação vacinal.
Outro desafio é o abandono do esquema vacinal. A tríplice viral, por exemplo, teve primeira dose aplicada em até 85% das crianças, mas a segunda não chegou a 50% em 14 estados. Essa vacina previne doenças como sarampo, caxumba e rubéola – enfermidades que ainda causam surtos no mundo e podem ser fatais.
Para enfrentar os obstáculos, os especialistas defendem ações inovadoras, como envio de lembretes por SMS, ampliação do horário de funcionamento dos postos e vacinação em escolas. “A escola resolve três problemas: acesso, informação e comunicação com as famílias”, resume Ballalai.
O Anuário reforça que, para conter o risco de reintrodução de doenças erradicadas, como a poliomielite, e controlar outras ameaças, como o sarampo, é urgente fortalecer as campanhas de vacinação e adaptar o sistema às novas dinâmicas da sociedade.